Que
as línguas foram dadas de forma sobrenatural não temos dúvidas, pois segundo
Jesus elas estariam ligadas a um revestimento de poder vindo do Céu. (Mc 16:17;
Lc 24:49). Porém, assim como em muitas das passagens da Bíblia de difícil
compreensão, os estudiosos divergem quanto ao tipo de língua que foi falada.
Uns
entendem que foram faladas línguas inteligíveis ou terrenas. Outros afirmam que
os discípulos falaram línguas ininteligíveis, isto é, as que os homens não as
entendem senão por interpretação divina.
Para
tentarmos elucidar esta questão, é necessário de antemão sabermos que o autor
do livro de Atos, o evangelista Lucas, usou duas palavras gregas que são
traduzidas como línguas, a saber, dialekto e glossa na
narrativa do derramamento do Espírito Santo.
Embora glossa e dialekto sejam
palavras diferentes, às vezes elas se referem a mesma coisa, pois no Novo
Testamento essas palavras ocorrem se referindo ao órgão que está na boca, aos
idiomas inteligíveis falados naturalmente pelos homens, como às línguas
ininteligíveis. Vejamos as ocorrências:
Dialekto fazendo
referência ao idioma inteligível (At 1:19, 2:6, 8, 21:40, 22:2, 26:14);
Glossa fazendo
referência ao idioma inteligível e ao órgão (Lc 1:64; At 2:26; Rm 3:13, 14:11;
1Co 13:1; Fp 2:11; Tg 3:5, 6; 1Jo 3:18; Ap 5:9, 10:11);
Glossa fazendo
referência à língua ininteligível que pode ou não vir acompanhada de profecia
(At 10: 46, 19:6; 1Co 14:2, 4, 13, 14, 19, 27);
Glossa e Dialekto se
referindo às línguas de Atos 2 (At 2:4, 8).
Dessa
forma, já ficou claro que será o contexto o principal responsável pela resposta
que buscamos.
Bem,
de acordo com texto lucano, após os discípulos começarem a falar em línguas
conforme o Espírito lhes concedia que falassem (At 2:4), os judeus que vieram
de muitas partes, como, por exemplo, da Mesopotâmia, da Judéia, da Capadócia,
da Frígia, da Panfília, do Egito e demais localidades (At 2:5-11), ficaram
perplexos por ouvirem os discípulos falando nas suas próprias línguas maternas
(At 2:8).
Até
aqui já ficou claro que os discípulos falaram nas línguas maternas dos
ouvintes. Mas queremos ainda chamar a atenção para uma pergunta que esses
homens fizeram a respeito do ocorrido que é fundamental para a conclusão:
Vede! Não são, porventura, galileus
todos esses que aí estão falando? (At 2:7 ARA)
Por
que eles fizeram essa pergunta enfatizando que os discípulos vinham da Galileia
e demonstrando total admiração?
Porque
quem habitava na região da Galileia não era bem visto pelos judeus da capital
Jerusalém, pois lá era uma região onde tinha um número considerável de gentios,
e por isso era chamada de Galileia dos gentios (Mt 4:15). Além disso, os
galileus não sabiam pronunciar o aramaico e o grego como os judeus que moravam
na capital, por exemplo, pois os galileus tinham um aramaico rude que ao
pronunciá-lo ficava fácil de saber de onde eles eram (Mc 14:70), e
provavelmente um grego capenga, o que teria feito com que os ouvintes ficassem
atônitos depois que os ouviram louvar a Deus em vários idiomas que eles não tinham
aprendido e com uma eloquência como antes jamais vista. (CHAMPLIN, R.N. O Novo
Testamento Interpretado. Edição Revisada. Vol 3. p. 58-59. 2014. HAGNOS).
Isto
é, as línguas faladas em Atos 2, embora dadas pelo Espírito Santo foram línguas
terrenas e não as que Paulo disse que quem as fala, não fala a homens, mas
apenas a Deus (1Co 14). E essa foi a conclusão de alguns mestres da Igreja,
como, Orígenes, Hilário de Poitiers, Eusébio de Emesa, Cirilo de Jerusalém,
Filastrius, Pseudo Constantius, Guadêncio de Brescia, João Crisóstomos, Rufino
de Aquiléia, Pelágio, Agostinho, Juliano de Eclano, Léo, o Grande, Teodoreto de
Ciro, Jacó de Serugh, Cassiodoro, Gregório o Grande e Paládio. (GUMERLOCK,
Francis. Toques in the Church Fathers. p. 125-131 apud RODRIGUES,
Zwinglio. Falar em Línguas. Um Estudo Sobre o Fenômeno da Glossolália. p.
40. 2016. REFLEXÃO).
Itard
Víctor Camboim de Lima
Por
Litrazini
Graça
e Paz
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