Certo dia, um casal ao chegar do trabalho encontrou
algumas pessoas dentro de sua casa. Achando que eram ladrões, marido e mulher
ficaram assustados, mas um homem forte e saudável, com corpo de halterofilista
disse:
- Calma pessoal, nós somos velhos conhecidos e estamos
em toda parte do mundo.
– Mas quem são vocês? – pergunta a mulher.
- Eu sou a Preguiça – responde o homem másculo. –
Estamos aqui para que vocês escolham um de nós para sair definitivamente da
vida de vocês.
– Como pode você ser a preguiça se tem um corpo de
atleta que vive malhando e praticando esportes? – indagou a mulher. – A
preguiça é forte como um touro e pesa toneladas nos ombros dos preguiçosos, com
ela ninguém pode chegar a ser um vencedor.
Uma mulher velha curvada, com a pele muito enrugada,
que mais parecia uma bruxa diz:
- Eu, meus filhos, sou a Luxúria.
– Não é possível! – diz o homem – Você não pode atrair
ninguém com essa feiúra.
– Não há feiúra para a luxúria, queridos. Sou velha
porque existo há muito tempo entre os homens; sou capaz de destruir famílias
inteiras, perverter crianças e trazer doenças para todos até a morte. Sou
astuta e posso me disfarçar na mais bela mulher.
E um mau-cheiroso homem, vestindo roupas maltrapilhas,
que mais parecia um mendigo, diz:
- Eu sou a Cobiça, por mim muitos já mataram, por mim
muitos abandonaram famílias e pátria; sou tão antigo quanto a Luxúria, mas eu
não dependo dela para existir.
- E eu, sou a Gula. – diz uma lindíssima mulher com um
corpo escultural e cintura finíssima. Seus contornos eram perfeitos e tudo no
corpo dela tinha harmonia de forma e movimentos. Assustam-se os donos da casa,
e a mulher diz:
- Sempre imaginei que a gula seria gorda.
– Isso é o que vocês pensam! – responde ela. – Sou
bela e atraente, porque se assim não fosse seria muito fácil livrarem-se de
mim. Minha natureza é delicada, normalmente sou discreta, quem tem a mim não se
apercebe, mostro-me sempre disposta a ajudar na busca da luxúria.
Sentado em uma cadeira num canto da casa, um senhor,
também velho, mas com o semblante bastante sereno, com voz doce e movimentos
suaves, diz:
- Eu sou a Ira. Alguns me conhecem como cólera. Tenho
muitos milênios também. Não sou homem, nem mulher, assim como meus companheiros
que estão aqui.
– Ira? Parece mais o vovô que todos gostariam de ter!
– diz a dona da casa.
– E a grande maioria me tem! – responde o vovô. –
Matam com crueldade, provocam brigas horríveis e destroem cidades quando me
aproximo. Sou capaz de eliminar qualquer sentimento diferente de mim, posso
estar em qualquer lugar e penetrar nas mais protegidas casas. Mostro-me calmo e
sereno para mostrar-lhes que a Ira pode estar no aparentemente manso. Posso
também ficar contido no íntimo das pessoas sem me manifestar, provocando
úlceras, câncer e as mais temíveis doenças.
- Eu sou a Inveja. Faço parte da história do homem desde
a sua criação, - diz uma jovem que
ostentava uma coroa de ouro cravada de diamantes, usava braceletes de
brilhantes e roupas de fino pano, assemelhando-se a uma princesa rica e
poderosa.
– Como inveja, se é rica e bonita e parece ter tudo o
que deseja? - diz a mulher da casa.
– Há os que são ricos, os que são poderosos, os que
são famosos e os que não são nada disso, mas eu estou entre todos. A inveja
surge pelo que não se tem e o que não se tem é a felicidade. Felicidade depende
de amor, e isso é o que de mais carece a humanidade... Onde eu estou, esta
também a Tristeza.
Enquanto os invasores se explicavam, um garoto, que
aparentava cerca de cinco a seis anos, brincava pela casa. Sorridente e de
aparência inocente, característica das crianças, sua face de delicados traços
mostravam a plenitude da jovialidade, olhos vívidos... E você, garoto, o que
faz junto a esses que parecem ser a personificação do mal? O garoto responde
com um sorriso largo e olhar profundo:
- Eu sou o Orgulho.
– Orgulho? Mas você é apenas uma criança? Tão inocente
como todas as outras. O semblante do garoto tomou um ar de seriedade que
assustou o casal, e ele então diz:
- O orgulho é como uma criança mesmo, mostra-se
inocente e inofensivo, mas não se enganem, sou tão destrutível quanto todos
aqui, quer brincar comigo?
A Preguiça interrompe a conversa e diz:
- Vocês devem escolher quem de nós sairá
definitivamente de suas vidas. Queremos uma resposta. O homem da casa responde:
- Por favor, dêem dez minutos para que possamos pensar.
O casal se dirige para seu quarto e lá fazem várias
considerações. Dez minutos depois retornam.
– E então? – pergunta a Gula.
– Queremos que o Orgulho saia de nossas vidas. O
garoto olha com um olhar fulminante para o casal, pois queria continuar ali.
Porém, respeitando a decisão dirige-se para a saída. Os outros, em silêncio,
iam acompanhando o garoto quando o homem da casa pergunta:
- Ei! Vocês vão embora também? O Menino, agora com ar
severo e com a voz forte de um orador experiente, diz:
- Escolheram que o Orgulho saísse de suas vidas e
fizeram a melhor escolha, Porque onde não há orgulho não há Preguiça pois os
preguiçosos são aqueles que se orgulham de nada fazer para viver, não
percebendo que na verdade vegetam.
- Onde não há orgulho não há luxúria pois os
luxuriosos têm orgulho de seus corpos e julgam-se merecedores. Onde não há
orgulho, não há cobiça pois os cobiçosos têm orgulho das migalhas que possuem,
juntando tesouros na terra e invejando a felicidade alheia, não percebendo que
na verdade são instrumentos do dinheiro.
- Onde não há orgulho, não há gula pois os gulosos se
orgulham de suas condição e jamais admitem que o são, arrumam desculpas para
justificar a gula, não percebendo que na verdade são marionetes dos desejos. Onde
não há orgulho, não há ira, pois os irosos com facilidade destroem aqueles que,
segundo o próprio julgamento, não são perfeitos, não percebendo que na verdade
sua ira é resultado de suas próprias imperfeições. Onde não há orgulho não há
inveja, pois os invejosos sentem o orgulho ferido ao verem o sucesso alheio
seja ele qual for; precisam constantemente superar os demais nas conquistas,
não percebendo que na verdade são ferramentas da insegurança.
Saíram todos sem olhar para trás, e, ao baterem a
porta, um fulminante raio de luz invadiu o recinto.
Transcrito Por Litrazini:
Graça e Paz
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