Por que o Antigo Testamento parece tão estranho e irrelevante para os
que vivem hoje a era da Nova Aliança? Por que tanta vezes lutamos para entender
como os eventos do Antigo Testamento se aplicam a nós nos dias de hoje?
Como as biografias dos santos do Antigo Testamento que parecem
desconexas podem fazer sentido para nós? Que relação os eventos como o exílio
de Israel na Babilônia e a restauração prometida têm a ver conosco hoje?
O
que devemos fazer a respeito de todos os relatos de condenação/salvação?
Existe, de fato, uma resposta muito simples para essas questões. A
Bíblia fala de morte e ressurreição. Muitas vezes falhamos em ver que todos os
eventos da revelação da Antiga Aliança caminham em direção à morte e à
ressurreição de Cristo. Isso foi o que Jesus disse àqueles dois na estrada de
Emaús (Lucas 24); e foi sobre isso que o apóstolo Pedro escreveu em 1 Pedro
1.10-12. Quando entendemos esse princípio, temos uma grande ajuda na leitura do
Antigo Testamento.
Muitos têm a leitura do Antigo Testamento prejudicada porque não vieram
a entender adequadamente que o esquema condenação/salvação do Antigo Testamento
(que consiste em julgamento e restaurações simbólicas, tipológicas) eram
figuras do que Cristo cumpriria por seu povo em sua morte e ressurreição. Havia
vários tipos de morte espiritual e ressurreição dos crentes em Cristo.
Em resumo, cada figura de condenação e salvação – de exílio e
restauração – é símbolo da morte e da ressurreição de Cristo. Fosse:
(1) o julgamento do mundo nos dias de Noé, seguido do mundo recém criado
que ele e sua família saíram da Arca para habitar, ou
(2) o julgamento de Babel, seguido pelo chamado de Abraão e a criação do
povo da aliança, ou
(3) o julgamento que caiu sobre o Egito (culminando na morte no Mar
Vermelho) e a salvação de Israel saindo do Mar Vermelho (ressurreição) como uma
nova criação simbólica; ou
(4) ou o julgamento-morte tipológico de Jonas na barriga do peixe e sua
subsequente restauração / ressurreição simbólica do lugar dos mortos; ou
(5) a condenação-exílio que Israel experimentou no cativeiro na
Babilônia que terminou na sua restauração para a terra prometida – Deus esteve
sempre prenunciando a obra salvífica de Jesus para o seu povo.
Além dos eventos redentivos que simbolizaram morte e ressurreição no
Antigo Testamento, há um número de pessoas que serviram como símbolos do
princípio morte-e-ressurreição em suas experiências.
A maioria de nós estamos familiarizados com o chamado de Abraão por Deus
para sacrificar Isaque. O que talvez não saibamos é que o escritor de Hebreus
nos conta que Abraão “recebeu-o de volta dos mortos simbolicamente”. Isso
aponta para além dele mesmo, para os sofrimentos de Cristo e as glórias que se
seguiram.
A vida de José também é marcada por duas experiências de morte e
ressurreição: primeiro, quando seus irmãos o jogam no poço (Gn 37.20) e depois
o vendem para os ismaelitas (morte), seguido da sua colocação como
administrador na casa de Potifar (ressurreição). Depois, há o relato da falsa
acusação e sua prisão (morte) seguidas de sua colocação no segundo cargo mais
alto do poder (ressurreição).
Além disso, a narrativa da vida de Davi também revela uma série de
experiências de morte e ressurreição simbólicas. Considere quantas vezes Davi
passou por situações de morte simbólica – escondido em cavernas e rejeitado por
todos – seguidas de “ressurreições” de exaltação e coroação.
Daniel foi jogado na cova dos leões (morte), uma pedra foi colocada
sobre a cova e, depois, foi tirado de lá, passando por uma ressurreição
simbólica. Como podemos não enxergar o paralelo com a ressurreição de Cristo na
remoção da pedra antes da ressurreição simbólica?
Sadraque, Mesaque e Abede-Nego também passaram por um tipo de morte e
ressurreição simbólica quando foram jogados dentro da fornalha ardente e depois
tirados de lá ilesos.
Todos esses eventos estavam preparando o povo de Deus para a maior morte
e ressurreição da história. Quando Jesus morreu e ressuscitou, tudo se cumpriu.
A restauração profética teve seu cumprimento glorioso. O povo de Deus foi elevado
com Cristo (Efésios 2.4-6) e sentou-se com ele nos lugares celestiais. Vern
Poythress faz a importante observação de que “o Antigo Testamento como um todo,
por meio de suas promessas, seus símbolos e suas figuras de salvação, aponta
para o cumprimento da salvação que ocorre de uma vez por todas na vida, morte e
ressurreição de Cristo”. Poythress explica como a travessia do Mar Vermelho
pelos israelitas tem como guia esse princípio de morte e ressurreição. Ele
escreve:
O batismo em Moisés na nuvem e no mar mencionado em 1 Coríntios 10.1-13
prefigura o batismo em Cristo, que, por sua vez, aponta para morte e
ressurreição substitutiva de Cristo. Uma série de eventos tipológicos do Antigo
Testamento prefigura o sacrifício substitutivo de Cristo. Em suma, Israel ficou
sob o domínio de Deus ao experimentar a morte na forma de substitutos
simbólicos.
A estrutura de juízo-salvação é mais claramente vista nas profecias de
julgamento-restauração dos Profetas Maiores e Menores. O SENHOR estava
constantemente ameaçando e executando a condenação de Israel pela quebra do
pacto. Geralmente, Deus usava os inimigos de Israel para subjugar o povo por
seus pecados.
No entanto, não se pode ler os profetas sem descobrir essa transformação
radical de condenação em bênção. Como que, no mesmo livro, o mesmo Deus pode
profetizar julgamento radical e salvação radical para o mesmo povo? A resposta
encontra-se no sacrifício substitutivo de Cristo. Talvez a prova mais forte
disso (além da profecia do Servo sofredor de Isaías 53) é encontrada nas
profecias de Sofonias.
O livro de Sofonias não começa de forma feliz. Deus prometeu a Israel
que traria sobre eles severa destruição por seu pecado (Sf 1.1-7), mas, no
final no livro, o SENHOR prometeu salvar e abençoar esse povo (Sf 3.14-20). O
que mudou? Em Sofonias 1.7 aprendemos que o julgamento de Israel está ligado ao
sacrifício. Explicando que o julgamento de Israel é sobre receber, o profeta
escreveu: “Pois o Senhor preparou o
sacrifício e santificou os seus convidados” (Sf 1.7). Essa deve ser,
provavelmente, a única vez em que o alvo do julgamento é chamado pelos profetas
de “sacrifício”. É a linguagem remanescente para o real e grande Israel,
Jesus Cristo, que veio “como oferta e
sacrifício a Deus, em aroma suave” (Ef 5.2). Cristo tomou para si a
condenação que merecíamos para então podermos receber a bênção da salvação.
Para que a ira de Deus fosse satisfeita e propiciada, Cristo teve de ser
sacrificado. Agora, nós que confiamos somente a Cristo nossa salvação, embora
merecêssemos a condenação de eterna punição e maldição, temos recebido vida e
bênção eterna. Ele se tornou maldição por nós para que pudéssemos ser
abençoados. Ele foi exilado da presença do Pai quando clamou: “Deus meu, Deus meu, por que me
abandonaste?” para que possamos receber as promessas de restauração e
eterna habitação na presença do nosso Deus.
NICK BATZIG / Traduzido por Carla Ventura | Reforma21.org
Por Litrazini
Graça e Paz
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